Que mão que fez? por Gisela Gueiros

Que mão que fez? por Gisela Gueiros

Feb 22, 2025Disco

Estava mobiliando um apartamento para aluguel aqui em NYC e fui diretamente naquela gigante dos móveis e cacarecos – que você monta em casa, tipo LEGO para adultos. Para minha alegria, encontrei cerâmicas lindas, baratézimas, que deixariam o apêzinho bem mais charmoso. Um vaso rosa, opaco, todo texturizado, custava cerca de US$ 12. Um achado!

 


Como nas minhas horas vagas faço cerâmicas, senti também um certo desconforto. Sei o trabalho que dá, a quantidade de tentativas e erros, as falhas-surpresa na hora da queima e… do charme que tem um objeto feito à mão. Na hora, pensei também no wabi-sabi: conceito estético japonês que se preocupa com a aceitação da imperfeição. Ou, outro jeito de dizer: wabi-sabi é o ideal filosófico que vê beleza naquilo que “deu errado”. No melhor estilo zen, essa visão valoriza o artesanal, a marca do que é humano e não industrial (ou digital). No mundo do wabi-sabi um vaso feito em linha de montagem não tem graça nenhuma.


Nesse sentido, me pergunto se o que é feito à mão me interessa mais por também trazer – ainda que indiretamente – as histórias imperfeitas de todos que participaram daquele processo. Afinal de contas, sabemos: há coisas feitas à mão que são “perfeitas”, não é? Assim como uma assinatura, o feito à mão carrega a marca única de quem fez aquele objeto. Podemos tentar fazer igual, mas… sempre será só parecido. 


Incorporar o erro ou a marca única da mão de quem fez como parte do sucesso é tão fundamental que a gente poderia até pensar na relação da palavra sucesso com a palavra sucessão. Uma sucessão de tentativas e erros é o que, no fim, leva ao sucesso. 

 

Hoje em dia, uma das regras na minha casa é que só entram pratos, xícaras e bowls de cerâmicas feitos à mão. Quando tomo café de manhã, aquela xícara me faz companhia. Não é a baratex que nos permite variar de xícara a cada gole de café - e claro que já tive muitas dessas –, mas o charme, o teor, a aura e o wabi-sabi desses objetos deixam minhas manhãs mais cheias de sentido. Quem fez, importa. E se quebrar… não tem outro igual.


Por Gisela Gueiros.



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