O planner e o prazer do supérfluo: Nem tudo precisa ter um propósito

O planner e o prazer do supérfluo: Nem tudo precisa ter um propósito

Oct 08, 2024Disco

Passeando pela internet, nos deparamos com um texto de uma sensibilidade ímpar. Carol compartilhou sua visão sobre os pequenos prazeres do dia a dia e, como protagonista desses momentos de indulgencia: o Trent Planner. Seu olhar para o sentir e pela apreciação dos momentos de indulgência é tão singelo que queremos compartilhar.




Carolina Ruhman Sandler é jornalista, escritora e uma apaixonada por livros e cadernos. Passou por diversos veículos de mídia como TV/Rádio Bandeirantes e Revista Claudia. Fundou o Finanças Femininas, a maior plataforma de educação financeira para mulheres do Brasil. Autora de três livros e uma grande produção de conteúdo sobre finanças para mulheres. Escreve semanalmente a newsletter literária Vou te Falar, onde explora seu universo interior e sua relação com o mundo contemporâneo, além de compartilhar dicas culturais a partir de uma curadoria humanizada. Cursa atualmente o Master of Liberal Arts na Johns Hopkins University.

O planner e o prazer do supérfluo
Nem tudo precisa ter um propósito

Eu não preciso daquilo. Gastei um dinheiro excessivo nele, inclusive. Mas o prazer que sinto ao abrir o caderno todos os dias de manhã compensa. Ele é de couro na cor bronze e a lateral das páginas é dourada. Na capa, quatro números: 2024. É o meu planner - e é lindo. 

O conceito de um planner nesta altura do campeonato é completamente anacrônico. Temos aplicativos suficientes para organizar a vida e deixar tudo na tela do celular: agenda, to dos, Notion. Minha organização digital é de causar inveja - chego ao extremo de ter uma wiki de todos os cardápios semanais que já criei. O Luiz olha para o meu caderno chamativo em cima da mesa e pergunta: você precisa mesmo disso?

De forma alguma. Mas nem tudo deve ser à base da necessidade. Gostamos de alguns objetos só por serem belos. Extravagantes. Desnecessários. Deliciosos.

É um pequeno ritual. Dá uma alegria enorme só de tirá-lo da bolsa. Pego minha caneta de quatro cores e começo a programar o meu dia. Anoto em roxo os compromissos, as reuniões, os almoços e encontros. Em rosa, planejo o momento de escrever a edição desta newsletter e todas as leituras e trabalhos do mestrado. Em laranja, as tarefas do trabalho - apenas as prioridades. Em azul, os grandes eventos: aniversários, viagens, festas. O resultado é uma semana colorida, uma página onde consigo enxergar como vou dar conta de tudo.

"Olho para as semanas anteriores e vejo o quanto realizei. O planner é um lugar de futurologia e arqueologia. Tudo que vivi deixa marca."

Os aplicativos do celular servem para lembrar de cada detalhe que compõe a rotina e o trabalho, um estoque organizado do oceano da vida de mãe-estudante-escritora-executiva (esta última é novidade). O caderno é o lugar do mais importante e estratégico, daquilo que amo e me dá prazer. Ao programar nele meu dia, me sinto organizada, planejada, eficiente. A caneta colorida dá um toque divertido. É um deleite usar a minha melhor caligrafia e ocupar todos os espaços.





Olho para as semanas anteriores e vejo o quanto realizei. O planner é um lugar de futurologia e arqueologia. Tudo que vivi deixa marca. 

Pode ser o Sol em Touro, mas eu gosto do material, do objeto belo, do conforto. O ato de pegar um caderno bonito é esteticamente delicioso. (Lembro de um dia em que um amigo que cursava Filosofia me acusou do outro lado de uma mesa de bar, no fim da adolescência: "você é uma esteta!". Morri de rir. O xingamento dele era motivo de orgulho para mim). 

É o mesmo tipo de prazer - embora bem menos elevado, confesso - que o de mergulhar em um quadro do Rothko ou ouvir Mad Rush. O belo não precisa de função ou propósito. O supérfluo também tem seu valor.

Então me deixa em paz com meu planner. Ele não é nenhuma obra de arte, mas é um pequeno espetáculo particular.

 Por Carol Ruhman.



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